sábado, 17 de março de 2018

SAUDADES DE LUGARES QUE NUNCA FUI


SAUDADES DE LUGARES QUE NUNCA FUI

   Sinto saudades de lugares que nunca fui; de estradas pelas quais nunca passei; de pessoas que nunca conheci! Como isso é possível? Não sei! Mas é assim!
   São estradinhas que não sei para onde vão, mas que parece que já andei por ali e então sinto uma saudade doída. São casinhas simples na beira das estradas que doem o peito quando olho para elas, são pessoas que imagino que estarão no final daquele caminho, muitas vezes de terra batida, ou dentro daquela casa pelas quais sinto uma ternura imensa. Nunca andei verdadeiramente por esses caminhos, mas me vejo ali, cavalgando ou somente caminhando sozinha, em paz, com prazer! Para onde estarei indo? O que encontrarei no final? Não sei!
   Quando era criança e passava por alguma casinha pequena, humilde onde só tinha uma janela e uma porta na frente, desejava morar ali. Achava que devia ser muito bom e a achava linda! Não me lembro de comentar isso com ninguém! Nem adulto e nem criança. Era um sentimento só meu; muito particular. Um segredo, eu acho! Talvez as outras pessoas julgassem uma coisa boba ou maluca. Não falava, ninguém sabia!
  Parecia que ali dentro tinha alguma coisa especial. Talvez fossem recordações escondidas da casa da D. Anita, que morava perto do nosso sítio e que tinha uma casinha pequenininha de chão batido, mas que era tão especial que chegava brilhar como se fosse encerado. Não sei! Talvez!
  Talvez fosse apenas curiosidade sobre o que teria atrás daquela portinha, ou fosse minha imaginação, que era grande, trabalhando com afinco para ver através das paredes. Mas talvez fosse só mesmo um sentimento de pertencimento, de reconhecimento ou de saber que ali, naquela casinha com uma janela só poderia ter uma vida cheia de janelas e portas com muitos sentimentos escondidos.
  Muitas vezes me imaginei abrindo aquelas portinhas e entrando naquelas casas, muitas vezes me imaginei continuando a caminhar por aquelas estradinhas ou a cavalgar por aqueles pastos sem saber onde iria parar. Um sentimento tão constante que ainda hoje sei como é. Recordo com todas as nuances essas imagens. Ainda hoje em viagens, olhando pelas estradas, me vêm esses pensamentos e me recordo de como me sentia e então outra vez sinto aquela saudade de pessoas e lugares que nunca vi.

 




ESCADA QUE NÃO VAI PARA LUGAR NENHUM


ESCADA QUE NÃO VAI PARA LUGAR NENHUM

   Na minha casa tem uma escada que não vai para lugar nenhum. Seu último degrau está encostado em um muro. O que aquela escada faz ali?
   É uma escada que dá em um muro, mas que leva a muitos lugares, a várias sensações e lembranças. Lembrança de um portão que existia ali e que foi testemunha de muitos acontecimentos.
   Passamos por perigo quando eu, ainda bem criança, vigiava a minha mãe para uma moça que foi criada lá em casa, namorar. Ela gostava de namorados que eram casados e os encontrava escondido e aquela escada e aquele portão nos fundos do quintal vinham a calhar. E eu ansiosa e com uma sensação enorme de perigo ficava vigiando os passos de minha mãe.
   Foi também testemunha de farra para as crianças e salvação para os adultos na época em que faltava água em Itaperuna. Era por ali que o caminhão pipa entregava a água solicitada. Os adultos carregando e eu me divertindo com aquele movimento todo.
   Também foi cenário para meus estudos. Era ali que eu me sentava, com um pé de mamão ao lado para estudar as matérias teóricas. Meu lugar preferido. Aprendia rápido.
   Então, ela leva para muitos lugares, mas para quem não conheceu aquele portão não pode nem imaginar o que aquela escada que não vai para lugar nenhum faz ali.
   São subidas e descidas por degraus reais e imaginários. Quando olho hoje aquela escada, que não vai para lugar nenhum, meus pensamentos são povoados por lembranças queridas e saudosas. Vejo tudo tão nitidamente que parece que estou vivendo novamente aqueles momentos. Eu, sentada naquela escada, estudando , pensando na minha vida tão curta ainda naquele momento, mas tão rica de experiências prazerosas.
   Temos, eu e a escada que não vai para lugar nenhum, lembranças cúmplices e amadas!